domingo, 21 de dezembro de 2008

ESPERANÇA

Maria cabisbaixa observa o trabalho das formiguinhas carregando folhas enormes para dentro das tocas, engraçado - pensava - elas andam todas pelos mesmos carreiros - eram avermelhadas, pequenas, não aquelas miudinhas que nem se enxerga, cuja a mordida é terrível, sua admiração aumentou quando viu um bando delas arrastando uma grande barata, aquele animal devia ser suculento, porque transportavam com vontade, ao lembrar de prato gostoso parava no tempo( ),e sua infância vinha à memória, os almoços de domingo com seus pais, a mamãe Hildegar tinha mãos especiais, a família obesa culpa dela,inventava aquelas delícias de tortas,cucas,assados.Mas deixa estar que em matéria de culinária herdara tudo da matriarca.Quando as suas três filhas eram menores lambiam os pratos, xingava aquelas alemozinhas pela falta de educação, no que corriam com os narizinhos sujos ora de feijão, ora de cremes.Enquanto viajava no tempo sentia que seu corpo era movimentado, ouvia vozes tipo: -"tira a Maria da área, está na hora dos remédios - outro exclamava - " iihh! tem que trocar as fraudas dela, não dá prá agüentar o fedor, misericórdia!" - a resposta - vai ter que esperar! tenho cinco "veios" na frente prá da banho,deixa aí fora então! a família que devia estar aqui sumiram! tudo madame! deixa aí!"- E aquela senhora de oitenta e nove anos ficava lá murmurando uma canção de ninar em alemão, observando as moscas que pairavam nas feridas das suas pernas.Foi internada pelas filhas no asilo, " Coração de Cristo", instituto particular, destinado a pessoas de baixa renda, o grupo era heterôgeneo em idade, sexo e nas doenças, misturavam-se, paralíticos com cegos, tetraplégicos e os que restavam dos "AVCs".
No outro dia era a mesma coisa, tudo igual, vez e outra tinha momentos de lúcidez e chorava,chorava, seu peito parecia que ia rebentar, seus olhos inchavam, seus "tratadores" diziam: -" lá tá a véia chorona outra vez, ahh! não tenho mais paciência, com este salário vou sumi!"- ela refletia . . .falava com Deus, -"onde foi que errei, me perdoa, tenha misericórdia, me leva para junto de Ti, cadê minhas filhas? será que morreram?não pode ser, minhas filhas!"- gritava - uma voz respondia- "não morreram não vó, te abandoram mesmo! mas elas vão paga! vão pagaa!" - Maria retrucava - "elas morreram, voces não querem me contar!" e chorava, chorava. . .
Chega sábado, é dia de visita, os velhinhos amanhecem ansiosos, querem tomar banho, fazer a barba, ficam cuchichando uns para com os outros, hoje o meu filho vai vir e o outro, a minha esposa Cecília vai trazer os meninos e as meninas, uma senhora quer pintar as unhas,colocar colar,pergunta onde está o baton.Após o almoço sentam-se uns na frente , na varanda, alguns ficam próximo ao portão de entrada seus coraçõeszinhos saem pelas suas bocas, tal ansiedade, olham os carros que desfilam na rua, passam os brancos, os cinzas,os amarelos,verdes, pretos, o sol começa a baixar e nenhum sinal dos parentes,neste momento um grupo de uma igreja vem entrando e cantando, louvando, eles participam conforme entendem, os crentes se vão e tudo volta . . . não . . . não volta ao normal, naqueles instantes souberam da morte de uma vózinha companheira, naquela semana já somam três que partiram e o resto da noite vira em gemidos,choros,lamentações, Maria com as auréolas vermelhas se compadece dos parceiros e nela uma esperança se aviva a cada hora, que a próxima será ela,tem que ser ela!.
ONDE ESTÁ O NOSSO VELHINHO(A),ESTAMOS AQUI GRAÇAS A ELES!!

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